Dizia Schumpeter no principio deste século que desenvolvimento econômico não é a nobreza ter méis de seda, mas os pobres também as terem. Mas na revolução industrial que ele viu bastavam lideres iluminados, pois o desenvolvimento era o fruto de grandes iniciativas, gerando vendavais de mudanças. Para o povaréu, bastavam algumas destrezas manuais.
Mudaram a economia e os processos produtivos. Hoje, o desenvolvimento econômico depende cada vez mais do que fazem os pequenos e os humildes. Do meu caderno de viajem reproduzo algumas notas:
- A água não flui no ralo do banheiro do hotel. Com a mesma tecnologia, os canos da suíça sempre funcionam.
- Por que o pedreiro não limpou o cimento que caiu sobre o azulejo, na época da construção do banheiro?
- Por que, ao pintar a parede, o pintor não pôs um jornal no chão, para impedir que este fosse também pintado?
- Na reunião marcada para as 10, metade chega na hora, mas é preciso esperar o ultimo retardatário, que chega as 10:30. Quanto vale o tempo dos que chegaram mais cedo?
- Pela porta entreaberta da cozinha do restaurante vejo uma jovem abrir uma lata com a ponta de uma faca usando o cabo da outra como martelo. Quanto custa um abridor?
- O ângulo reto na Alemanha, onde foi feito o esquadro, tem exatamente 90º graus. Por que o ângulo da esquadria feita não tem também 90º graus? Tampouco deveria haver fresta no canto da porta?
- Desmarquei meu compromisso para esperar o concerto da maquina de lavar, e ele não veio. Na França, deixava a porta aberta para que entrasse, fizesse o concerto e mandasse depois a conta pelo correio.
- Se ninguém esta olhando, o peão para de trabalhar. Portanto, haverá uma capataz tomando conta e subtraindo do que poderia ser o seu salário.
- Perguntei ao guarda, na rua principal, onde estavam as famosas ruínas maias. Não sabia. Perguntei à funcionária do labiríntico aeroporto de Frankfurt quanto tempo para o portão F26: três minutos e meio.
- Acabou a cerveja, lá se vai à lata pela janela. Mas o excursionista suíço guarda a lata vazia na mochila para jogar no primeiro lixo disponível. Quem tem mais recursos para pagar o catador de lixo?
- A 4500 metro de altitude, nos Andes, encontra-se a caçamba cheia de mistérios de estanho com outras vindo na direção oposta. Solução: os mineiros levantam umas delas na unha e tiram da linha, para poder passar a outra deve haver uma tecnologia melhor.
- Buzinha o motorista indignado. O preço do seu desabafo sonoro é o desconforto de dezenas de pessoas ao redor.
- O peão de meu amigo Barreto matou todas as suas vacas, pois pensou que a dose era um viro de remédio, em vez de uma colher.
- Explicava-me o chofer de táxi em Cingapura que atrair turistas é fácil, o difícil é fazer é fazer com que voltem. Fiquei pensando nos nossos.
Quando pensamos nos países avançados, as imagens que nos vêm à cabeça são as obras monumentais, as viagens à Lua, os prêmios Nobel, os salários altos e por ai afora. Mas deixamos de observar o pequeno, o detalhe, como a gente comum cuida do cotidiano.
Temos alguns líderes educados e com visão, nas empresas, no governo e na ciência. Não estudaram em universidades piores nem são menos preparados do que os líderes dos países mais ricos. A diferença não esta neles, mas no ato cotidiano do trabalhador, do pequeno funcionário. É ai onde se originam e perpetuam as diferenças de produtividade e a qualidade de vida. Um país é atrasado pelo somatório dos pequenos atos malfeitos, matados, improvisados, impensados e de horizonte curto.
Mas, obviamente, não podemos culpar nosso povo pelo que lhe falta em educação e civismo. Os brasileiros vivem no mundo onde os que podem um pouco mais toleram uma péssima educação. Somos nós os culpados. Ao pensar nas maravilhas dos países ricos, devemos entender que a grande diferença não esta nos planos grandiosos, na engenharia mirabolante, mas no comportamento cotidiano da sociedade dos que estão na base da sociedade. Se não criaríamos as condições para que esses comportamentos mudem, nada feito. Viveremos dos sonhos do país do futuro.
Claudio de Moura Castro
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